segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

GASPAR FRUTUOSO

Os elementos disponíveis sobre a vida do Padre Dr. Gaspar Frutuoso (sobretudo no que diz respeito à sua família e à juventude, passada em grande parte fora de S. Miguel), são poucos e incompletos.
Sabe-se que nasceu na cidade de Ponta Delgada (então vila), da ilha de S. Miguel, no ano de 1522, no seio de uma família com posses e de boa condição social. Seria filho de Frutuoso Dias e de sua primeira mulher, Isabel Fernandes.
Frequentou a Universidade de Salamanca, onde concluiu os bacharelatos em Artes e Teologia, em 1558. Salamanca era, ao tempo, um meio cultural importante, onde não faltavam intelectuais de alto nível. Mesmo assim, o jovem Gaspar Frutuoso não deixou de sobressair, com distinção, nos seus estudos universitários, sendo mesmo apelidado de EI grande sabio de las Islas de Portugal.
Frutuoso, ao que tudo indica, veio à ilha de S. Miguel tomar ordens de sacerdote, provavelmente nas férias de 1554, regressando depois à Universidade de Salamanca.
Acabados os estudos em Salamanca, vemo-lo servindo, entre Outubro de 1558 até Março de 1560, na Igreja Matriz da Lagoa, em S. Miguel. Só depois deve ter partido para o Continente, tendo-se fixado na Dioceses de Bragança (onde se manteve durante o governo do bispo D. Julião de Alva, que lhe concedeu benefícios com rendimento superior a mil cruzados), leccionando no Colégio dos Jesuítas, ali fundado em 1561.
Ter-se-á também doutorado, por esta altura, provavelmente, em Évora.
Em 1564, Frutuoso renunciou a todos os seus benefícios e abandonou Bragança, para regressar a S. Miguel, aceitando os cargos de vigário e pregador da Matriz de Nossa Senhora da Estrela da vila da Ribeira Grande, de que tomou posse a 15 de Agosto de 1565.
É, portanto, aos 43 anos que Gaspar Frutuoso, munido de grande ilustração e experiência, abandona uma vida animada por viagens e convívio com gente culta e distinta, para se tornar no humilde pároco da Ribeira Grande.
É na Ribeira Grande que fica até ao fim da vida e onde, para além do trabalho paroquial e da prática da caridade, constrói o importante legado histórico que deixou. A investigação e a recolha das tradições das ilhas, cujo povoamento se verificara há pouco mais de cem anos, dão origem à sua grande obra, Saudades da Terra, a principal e quase única fonte do início dos tempos históricos das ilhas dos Açores.
Gaspar Frutuoso morreu a 24 de Agosto de 1591, tendo dito missa na sua igreja ainda nesse dia e, segundo o respectivo termo de óbito, sem ter feito testamento, por Nosso Senhor o chamar de pressa e não ter tempo.

Foi sepultado na capela-mor da sua igreja, acima dos primeiros degraus, quase defronte do altar-mor. Em 3 de Setembro de 1866, as suas cinzas foram trasladadas para o cemitério da Ribeira Grande. Sobre o local em que repousam esses restos, erigiu-se um pequeno mausoléu, em que está escrito o seguinte:

Aqui jazem as cinzas do Revd.º Gaspar Fructuoso, historiador das ilhas dos Açores e doutor graduado em philosophia e theologia pela Universidade de Salamanca, o qual nasceu na cidade de Ponta Delgada em 1522 e faleceu nesta Villa em 24 de Agosto de 1591. Tendo recusado o bispado de Angra que em seu favor quizera resignar o ex.mo Bispo D. Manoel de Almada, preferiu à mitra a vigararia da Matriz desta Villa, que serviu por 40 anos. A Camara Municipal deste concelho a expensas do município e coadjuvada pelos donativos de alguns michaelenses, mandou erigir este monumento à memoria de varão tão insigne em letras e em virtudes, 1867.
O Padre Dr. Gaspar Frutuoso foi o primeiro cronista insulano. A sua personalidade é curiosa sob diversos aspectos (…) porque, a par de sacerdote virtuosíssimo, Frutuoso representa plenamente o tipo do humanista da Renascença, enciclopédico quinhentista, literato, artista e músico, observador atento dos fenómenos naturais, preocupando-se com experimentações alquimistas e tentando especulações nos domínios da geologia, da mineralogia e da petrografia (1). Na ilha de S. Miguel, onde viveu a maior parte da sua existência, foi sem dúvida um dos homens mais ilustrados do seu tempo, e pelos seus méritos, saber e prestígio, um cidadão que muito deve ter influído no aperfeiçoamento dos costumes e na organização da sociedade coeva, a um século da primitiva colonização e, portanto, no período mais interessante do seu incipiente desenvolvimento administrativo, agrícola, industrial e comercial.

Fonte: Rodrigo Rodrigues, Notícia Biográfica do Dr. Gaspar Frutuoso, in Saudades da Terra, edição do Instituto Cultural de Ponta Delgada

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(1) Colaborando com o seu patrício e amigo Gaspar Gonçalves, que com ele estudou em Salamanca e que, depois, foi médico na Ribeira Grande, onde fez várias experiências que determinaram a fundação da fábrica de pedra-hume e, também, ensaios experimentais na persuasão de encontrar prata em S. Miguel.

2 comentários:

Mar de Bem disse...

Eu tenho os 6 volumes de "Saudades da Terra", mas acreditas que só vi e li a parte respeitante ao Pico e Faial e nem sequer li aquilo que aqui nos trazes? Eu nem sequer sabia que ele era doutorado em Teologia, imagina!
Tinha saudades de vir aos blogs!!!!!!!!!!!!!!!
Bjs

Elisabete disse...

E eu também já tinha saudades desses comentários...
Li as Saudades, não integralmente, quando dei aulas na Ribeira Grande, porque existia a obra na biblioteca da Escola. Claro que é difícil de ler, mas há aspectos que vale a pena conhecer. Vou tentar, aos poucos, passar para aqui alguns deles.
Beijinhos