"Não se descobrem novos oceanos se não se tiver coragem de perder a terra de vista."
André Gide
Esta foi uma das imagens que guardei da minha primeira viagem a S. Miguel. Ali, nas Sete Cidades, junto àquela casa (Que bela estalagem daria!), apenas nevoeiro... Não se via "um palmo à frente do nariz" e, de repente, surge do meio da bruma o burrico, o homem e as vasilhas do leite. Entendi todo o mistério da brumas: o que encobrem e o que mostram. Foi um momento mágico, quase irreal, que nunca mais esqueci.
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Foi em Abril de 1999. Estava de licença sabática e pude permanecer, na Ilha, três semanas. Dias de encantamento e o sentimento estranho de que tinha encontrado, finalmente, o “meu lugar”.
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Voltei mais vezes, até que me mudei de vez. Nunca me arrependi. A paisagem de quadrados verdes luminosos, negros, suaves ou fortes, acompanhando o movimento das nuvens. As flores… o tempo das azáleas, dos jarros, das hortênsias, das conteiras, das beladonas (Meninos, p’rá Escola!) e de todas as outras. As caldeiras e fumarolas...
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As lagoas e os seus mistérios… a permitirem experiências quase místicas. Os pássaros… os bandos de estorninhos, os milhafres, os melros, os santantoninhos, os cagarros, as alvéloas. E as plantinhas a que, antes, não prestava grande atenção e das quais não sabia o nome, como a bem-cheirosa madressilva ou o saboroso poejo.
Ah! O mar… lindo de morrer! O desejo de nele ficar, quando nadava. O bem que me sentia… Chegava a pensar:
Será assim que os bebés se sentem no líquido amniótico?
A fruta… o ananás (personalizado e único), os capuchos (que aqui encontro sob o nome de phisalys e caríssimos), os maracujás, as enormes anonas, os araçás . E o chá, e o bolo de sertã, e a massa sovada, e as queijadas, e os bolos lêvedos das Furnas, e as “fofas” da Povoação. E a carne e o peixe… de óptima qualidade. E a manteiga, e os queijos, e os iogurtes, e o cheirinho do leite do dia a ferver. É preciso dizer mais?
Senhor Santo Cristo e Espírito Santo, os Romeiros… O artesanato e a surpreendente oferta cultural duma cidade como a Ribeira Grande. Assisti a espectáculos, de teatro e música, muito bons; confirmei a natural tendência dos açorianos para as Artes; descobri escritores que ocupam, hoje, um lugar de destaque na minha modesta biblioteca. Li “Saudades da Terra”, do Gaspar Frutuoso. Amei, ainda mais, o meu Antero de Quental, que considero um dos maiores vultos da cultura portuguesa e um ser humano extraordinário.
Com amigos, voei para as outras ilhas… todas lindas!!! Faltam quatro, mas lá irei. Fiz caminhadas enormes e esplendorosas com “Os Amigos dos Açores”. Acreditei estar no PARAÍSO.
Mas… a vida não pára. Tive de voltar ao Porto. Houve amigos que vieram também. Alguns ficaram. Mas do meu coração não saem mais. A eles devo o muito que conheci dessas ilhas espantosas [as “nossas ilhas”], o carinho e o “ombro” amigo sempre que precisei, as “tertúlias”, em amena ou acesa discussão, as petiscadas bem-humoradas; com eles partilho a saudade desses anos e da nossa aventura açoriana.
Para aguentar as saudades, tenho a casa cheia daquilo a que chamo “os meus cantinhos açorianos”. Tirei algumas fotografias para que vissem.
As quatro obras-de-arte numeradas são da autoria de uma dessas amigas que também voltou. A Elsa teve o cuidado de pôr a sua arte ao serviço da minha (também sua) paixão pelos Açores. É uma boa amiga… como os outros todos, cada um a seu modo.
Como já ficou provado, os que ficaram estragam-me com mimos.
Gosto mesmo muito de vocês todos! Para sempre!
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Não nasci nos Açores, é verdade. Mas…
Sou uma continental rodeada de Açores por todos os lados.
7 comentários:
Olá Elisabete!
Tu não estás rodeada pelos Açores, tu tens mesmo os Açores dentro de ti!
Já não me lembrava da pedra de basalto.
És uma querida - muito "requinha"!
Bjs
emfrosa2
Estás a ver? Está tudo em lugar de destaque. Só que o "post" não comportava tanta coisa.
Mesmo, no texto, esqueci-me de certas coisas importantes de que queria falar, mas não se deve esgotar o repertório...
Beijos para a minha pintora e artesã preferida. Ainda hoje me parece impossível que te metesses a fazer o Registo, ainda por cima com a figura do Senhor Santo Cristo desenhada e pintada por ti.
Qualquer dia oferecem-te um contrato de trabalho lá em S. Miguel.
Gostei do "requinha"...
"Requinha" Elsisabete!
Penso que requesitada vais ser tu, mas para escrever um livro sobre as tradições Açoreanas pelos olhos de uma continental.
A seguir ao blog... nunca se sabe...
:)
emfrosa2
Boa noite, Elisabete.
De facto sabe tão bem ler os seus posts...
... a distância entre o continente e as ilhas fica bem mais pequena...
... só têm um defeito: dão tanta vontade de voltar... e ficar...
Já agora, deixe-me colocar uma questão...
... tenho procurado galerias de arte açoreanas on-line com vista a adquirir pinturas referentes aos Açores... Por acaso conhece alguma?
Obrigado.
Acores,
Infelizmente, não conheço.
Tenho a minha pintora privativa, a Elsa (=Emfrosa2). As peças de artesanato comprei nas ilhas.
Tem razão, nem sei se este blogue me atenua ou aumenta as saudades.
Acho que vou copiar o nosso rei D. Pedro IV em relação ao Porto. Ofereço o meu coração a S. Miguel e fico lá para sempre.
Volte sempre!
Para se ser açoriano, não é necessário ter-se nascido lá.
Basta ter "alma" de ilhéu.
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